As ‘Achometrías’ e a Arte de Evitar Interpretações Enviesadas no Marketing
Por Teodoro Fernandes

Há palavras que nos obrigam a parar. E a “Achometría” parece ser uma delas. À primeira vista, pode ressoar a uma palavra técnica, pesada, fora do vocabulário comum no marketing. Mas talvez seja exactamente por isso que precisamos dela, aqui neste texto, precisamos de palavras fora da caixa para melhor explicarmos a sua dimensão.
Confundida com a geometria, a “Axonometria”, é uma técnica de representação geométrica que permite visualizar objectos tridimensionais num plano bidimensional, mantendo as relações de paralelismo e as medidas originais, mas também, com o pensamento desenvolvido pela agência portuguesa, a Ivity, que no seu artigo BTachometro, que abordou sobre a leveza que se tem no achar, ao ponto em que se confunde facilmente a democratização da opinião com a legitimidade e obrigatoriedade em expressá-la. Este conceito propõe-nos algo mais do que um simples exercício visual: desafia-nos a ver sem distorcer, a representar a realidade como ela é – e não como achamos que seja, ou como deve ser de acordo com a nossa percepção das coisas.
Muitas decisões em marketing falham, não apenas por falta de dados, mas por excesso de opiniões mal formadas. Achar substituiu o saber. Na era das energias, a intuição ocupou o lugar da análise. E os projectos passaram a ser conduzidos não por quem estuda, e procura entender os fenómenos, mas por quem “acha” mais alto – ou porque está mais perto do poder.
O marketing, quando se baseia apenas em achismos, não é estratégia. É um palpite com verniz. E isso, mais cedo ou mais tarde, um dia estala.
A Ivity chamou a isto o “achómetro”, um espaço onde todos se sentem autorizados a “achar”, mesmo sem base, método ou noção do impacto que uma opinião gratuita pode ter num processo delicado como o de criar uma marca, um negócio um projecto, uma vacina ou até mesmo governar um país.
O Carlos Coelho escreveu que “o futuro das marcas não pode ficar sujeito ao que todos acham”. E tem razão. Quando os projectos são moldados por consensos mal informados, nascem com o medo de desagradar. Os criadores ou pensadores hoje procuram unanimidade, mas quando assim acontece, caem na mediocridade. E, como também disse Nelson Rodrigues, “Toda unanimidade é burra.
Continuando, “quem pensa com unanimidade não precisa pensar”, porque retira imagem e a criatividade ao pensamento que não seja único ou alinhado ao que é conveniente ou aos humores colectivos. Para ele, Nelson Rodrigues, era preciso resistir à tentação do consenso fácil e enfrentar o desconforto da dúvida mesmo que isso nos colocasse contra a maioria. Tal como no Brasil na década em que ele escreveu, em Angola, não se está a pensar com profundidade. A verdade costuma ser impopular e, por isso, raramente é unânime. Mas no fim fica sempre claro; ver é diferente de interpretar. Não fosse eu um apaixonado por um dos teoremas matemáticos mais brilhantes de sempre, o da Incerteza.
No nosso contexto, este fenómeno, o “achismo”, torna-se ainda mais relevante e está em crescente popularidade ao ponto de estarmos todos familiarizados e de celebrarmos publicamente a imbecilidade. E à medida que os educandos se vão analfabetizando, a qualidade dos alfabetizados reduz, primeiro pela insistência de alguns docentes que vêem prazer em reprovar um aluno, segundo pela necessidade escrupulosa de se cumprirem pautas, a de alunos formados num determinado ciclo lectivo, vejo muito pouco progresso diante da escassez de sucesso e sede de resultado, sejam eles quais forem.
Entretanto, importa referir que muitos projectos falham, não por má intenção, mas porque a perspectiva é vista de um só ângulo. Parte-se sempre do pressuposto de que se conhece o consumidor angolano — “acha-se” que ele é assim ou assado — sem nunca o ouvir, verdadeiramente, efectivamente, portanto, entretanto.
No entanto, é comum, embora que desrespeitoso e desprestigiante, os executivos contratarem profissionais para dizer-lhes, e obrigarem-nos a ouvir: “a minha empregada disse que gosta”, “a minha prima tem uma página nas redes sociais e faz assim”, “o meu sobrinho está sempre online e garantiu que resulta”. E tem sido com base nestas percepções individuais, supostamente bem-intencionadas, mas desprovidas de método, que se constroem estratégias inteiras com estes “achismos” como sustentação e depois espanta-se que o mercado não responda.
Assim, assistimos ao nascimento de marcas ou projectos que, à partida, têm tudo para resultar: orçamento, equipa, ambição. Mas caem na armadilha do “parece que sim” e “fica giro assim”. Porque, como alguém disse no BTachómetro, “uma marca que resulta de uma média achométrica tende, normalmente, para a burrice ou para a cegueira”.
Falar de “achometría” é reconhecer que ver bem, exige metodologia. Achar pressupõe buscar, investigar, procurar. Toda a decisão estratégica precisa de ser pensada a partir de múltiplos ângulos (Pensamento Lateral) — e não apenas dos corredores e salas de reuniões da sede de uma empresa.
Não é de todo fácil nem impensável, mas adoptar a humildade de aceitar que a nossa percepção está sempre condicionada pelo lugar onde nos encontramos, pode ser o primeiro passo. E admitir que só há uma forma de ultrapassar isso: ouvir, investigar, modelar cenários e testar hipóteses, o segundo.
Uma marca séria não nasce de brainstorms cheios de gente a encher chouriços, mas de equipas curtas e alinhadas, como bem defende o Paulo Rocha.
Porque os “achos”, são como as cerejas, atraem pragas ou selvagens — mas no marketing, provocam indigestão.
E agora?
Este é o segundo artigo de um ciclo sobre o marketing feito com mais profundidade e propósito. No próximo artigo, vamos explorar a forma de como o erro pode ser um activo estratégico, se for encarado com humildade e método.
Errar não é o problema. O verdadeiro erro está em “achar” que não errámos.
Até ao próximo episódio!
Teodoro Fernandes é um estratega de marcas, curioso por natureza e apaixonado por ideias que transformam. Ao longo dos anos, tem ajudado organizações a encontrarem clareza na forma como se posicionam, comunicam e actuam sobretudo em contextos onde o marketing precisa de ser mais do que um discurso.