Bancos Tradicionais Sob Pressão de Concorrentes Digitais, Alerta BCG
Consultora norte-americana identifica desafios estruturais no sector bancário tradicional

O sector bancário tradicional enfrenta pressão crescente de fintechs, bancos digitais e fundos de crédito privado, de acordo com um novo relatório da consultora Boston Consulting Group (BCG). O estudo, intitulado “Fit for Growth, Built for Purpose“, sugere que apesar do crescimento global da indústria bancária de 4% nos últimos cinco anos, os bancos tradicionais estarão a ceder terreno em áreas valiosas do negócio a novos concorrentes.
Segundo a análise da consultora, que presta serviços de estratégia a instituições financeiras globalmente, os bancos tradicionais dependeram essencialmente do crescimento das receitas de juros líquidos (cerca de 85% do crescimento total), mas têm dificuldades em gerar receitas não dependentes do balanço. As receitas por comissões, embora tenham crescido 1,8% em termos absolutos, diminuíram 18% relativamente aos activos.
“A maioria dos bancos está frustrada com a lenta concretização de valor da inteligência artificial e da IA generativa. A nova tecnologia choca contra as formidáveis barreiras da infraestrutura legacy e, mais importante ainda, da cultura legacy”, explica Saurabh Tripathi, Diretor Executivo e Sócio Sénior da BCG, líder global da prática de Instituições Financeiras da consultora.
Crescimento de Novos Operadores
O relatório indica que no sector da banca de retalho, os bancos challenger e as plataformas fintech estarão a conquistar quota de mercado e confiança dos investidores. Segundo a BCG, em alguns mercados, as bases de clientes dos bancos digitais já rivalizam com as dos operadores tradicionais. Na banca corporativa e de investimento, os fornecedores de liquidez não bancários e os fundos de crédito privado estão a capturar partes significativas das receitas que os bancos tradicionais dominavam há muito tempo.
O crescimento das stablecoins é outro sinal de mudança: apenas em 2024, processaram cerca de 4 biliões de dólares em volume de transacções, sinalizando uma potencial reorganização mais ampla da infraestrutura financeira.
Pressões Internas Agravam o Cenário
Para além da concorrência externa, os bancos enfrentam pressões internas significativas. Apesar dos investimentos substanciais em tecnologia, muitos não estão a concretizar os ganhos de produtividade esperados. Em vários mercados importantes, incluindo a Europa e o Reino Unido, o investimento tecnológico elevado não se traduziu em maior eficiência. Enquanto os concorrentes continuam a crescer, muitos bancos tradicionais ainda utilizam modelos de cost-to-serve até dez vezes mais caros de operar.
Características dos Bancos com Melhor Performance
A análise da BCG identifica três padrões comuns nos bancos com melhor performance no mercado: escala doméstica (não apenas dimensão), especificamente em termos de liderança no mercado interno; capacidade de gerar uma quota superior de receitas por comissões; e produtividade competitiva.
Segundo a consultora, os bancos líderes seguem quatro abordagens estratégicas: digitalização integral (front-to-back); centralidade no cliente; modelos de negócio focalizados; e estratégias de fusões e aquisições. Todas estas abordagens exigem, segundo o relatório, capacidades digitais robustas.
“Os bancos precisam de olhar com ousadia para o seu portfólio de negócios e tomar decisões difíceis para se concentrarem em menos áreas onde podem vencer”, afirma Andreas Biffar, Diretor Executivo e Sócio da BCG e co-autor do relatório. “A simplificação de produtos e processos com digitalização abrangente front-to-back é um elemento incontornável no contexto actual.”
Inteligência Artificial: Oportunidade e Desafio
A implementação estratégica bem-sucedida da inteligência artificial pode ser revolucionária, embora muitos bancos ainda tenham dificuldades nesta área. O relatório sugere que os bancos precisam de adoptar uma abordagem vigorosa e focada na implementação da IA. Se a IA ainda não trouxe resultados para todos os bancos, isso pode dever-se mais aos desafios de escala e falta de adopção holística por parte de funcionários e clientes do que a questões tecnológicas.
Com o surgimento da Agentic IA e da voz automatizada como alavancas de produtividade ainda mais poderosas, os vencedores tomarão medidas eficazes para as incorporar. No entanto, a IA por si só pode não ser suficiente, já que muito do valor potencial pode ser capturado por operadores não bancários, que estão actualmente melhor posicionados para beneficiar das suas aplicações.
Um Novo Contrato Social Necessário
O relatório argumenta que a viabilidade a longo prazo da indústria bancária requer que bancos, reguladores e decisores políticos estabeleçam um novo acordo que promova a experimentação ousada, a integração de activos digitais e o acesso a escala sintética para instituições menores.
A análise da BCG revela que 75% do capital bancário global negoceia abaixo do valor contabilístico, demonstrando o cepticismo dos investidores relativamente ao modelo tradicional. Para reverter esta tendência, será necessária uma transformação radical que vai muito além das melhorias incrementais que têm caracterizado o sector nos últimos anos.
O documento conclui que o sector bancário se encontra num momento de mudança significativa. A consultora prevê que os próximos anos serão determinantes para definir quais instituições se adaptarão com sucesso ao novo paradigma digital e quais enfrentarão maiores dificuldades competitivas.
Nota editorial: A Boston Consulting Group é uma consultora de estratégia que presta serviços a instituições financeiras, incluindo bancos tradicionais e fintechs, o que deve ser considerado na análise das suas recomendações e conclusões.