A Reputação da Marca Constrói-se com Actos – Não Apenas com Storytelling
Por Teodoro Fernandes

Há marcas que querem ser amadas. Outras, que querem ser ouvidas. Mas a maioria, no fundo, apenas quer ser tolerada, desde que o consumidor compre o seu produto.
Falam de valores. De missão. De propósito. Mas, no quotidiano, as acções desmentem as palavras. Porque falar é fácil. Difícil é sustentar. E, hoje, o mercado já não perdoa esse desfasamento entre o que se diz e o que, de facto, se faz.
A reputação já não se cria, revela-se. E quando é erguida sobre a notoriedade e frases feitas, basta um sopro de verdade para desmoronar. O vazio entre o discurso e a prática nunca foi tão visível nem tão fácil de medir, escrutinar e expor. Vivemos num tempo em que tudo se vê. E, mais do que isso, tudo se partilha. O consumidor deixou de ser apenas receptor: é também editor, crítico, curador e amplificador. Neste novo cenário, a reputação constrói-se com coerência. E, sobretudo, com actos que resistem ao teste do tempo e da verdade.
Durante décadas, as marcas detinham o monopólio da narrativa. Definiam o discurso, produziam o spot, escolhiam os meios e impunham a versão oficial. Hoje, isso acabou. O consumidor filma, denuncia, comenta, exige. E nunca esquece. Basta uma imagem, uma resposta fria, um áudio vazado… e tudo o que foi construído em anos pode ruir em horas. Se a reputação não for sólida, a queda será pública e estrondosa.
Não é apenas uma questão do que dizemos sobre nós próprios, mas sobre o que conseguimos sustentar. Porque a diferença entre marca e máscara, o consumidor já se apercebeu, é de apenas uma letra.
Veja-se o caso da Pepsi, caiu na armadilha do discurso, tentou apropriar-se de causas sociais com um anúncio bonito, mas vazio e por isso pagou o preço alto. Não por se ter posicionado a favor da causa, mas por te-lo feito sem verdade, sem emoção, nem autenticidade.
A Adidas, por sua vez, já tivemos a oportunidade de mencionar no artigo anterior, cometeu um erro muito sensível: enviou um e-mail pós-maratona com o título “Parabéns, sobreviveste à Maratona de Boston”. A Memória do atentado de 2013 era recente as feridas continuavam vivas. O resultado foi desastroso. Mas a marca fez aquilo que muitas não têm coragem de fazer: reconheceu, pediu desculpa, corrigiu. E a reputação manteve-se. Porque quando há humildade e acção, até o erro pode reforçar a confiança.
Mas, houve casos em que o erro não foi apenas um lapso foi estrutural. A BP, após o desastre ambiental no Golfo do México, demorou a mostrar empatia e transparência. O CEO chegou a afirmar que só queria a sua vida de volta, ignorando a dimensão humana e ambiental da tragédia. A Volkswagen, no escândalo do Dieselgate, foi apanhada a instalar software fraudulento para manipular os testes de emissões. Nos dois casos, as tentativas de camuflar a verdade agravaram o dano. Porque uma marca pode errar mas quando tenta enganar, perde o que há de mais difícil de reconquistar: a confiança.
Há, no entanto, marcas que não dizem e fazem. E são essas que ganham tempo, respeito e espaço.
A Domino’s Pizza, nos Estados Unidos, podia ter feito mais um anúncio brilhante. Optou por tapar buracos nas estradas. Literalmente. O objectivo? Garantir que as suas entregas não atrasassem nem chegassem frias por causa da má condição das vias.
Menos frases, mais acção. Uma solução simples, com impacto directo. Uma reputação construída no asfalto.
Na Índia, uma marca local criou pequenos peixes de ferro para serem colocados nas panelas durante a cozedura, ajudando a combater a deficiência de ferro nas populações. Gerou storytelling. Recebeu prémios. Mas, acima de tudo, apresentou uma solução real com propósito.
Não são apenas histórias de criatividade. São histórias de humanidade.
Por cá, na banda, ainda somos reféns da estética. Queremos que se fale da marca, mesmo que ninguém saiba o que ela faz. Fazem-se grandes campanhas, mas esquecem-se os pequenos gestos. Valoriza-se a fotografia da doação, mas não a constância do apoio. Fala-se de amor à pátria, mas desiste-se de escutar. Grita-se “sustentabilidade” ao mesmo tempo em que tudo é importado.
A reputação à moda angolana, está agora a ser escrita e talvez essa seja a nossa maior oportunidade. A de fazer diferente, de fazer melhor. De construir marcas que, mesmo sem falarem muito… façam imenso.
Os últimos estudos, como o Meaningful Brands da Havas, indicam que 73% das pessoas desejam que as marcas sejam mais humanas e ajudem a resolver problemas reais. Mas querem, acima de tudo: Verdade. Coerência. Simplicidade.
A reputação deixou de ser a imagem que se percepciona. Passou a ser uma espécie de contrato. Um acordo tácito entre a marca e a sociedade.
E o consumidor? Este, já não se guia por slogans. Guia-se por actos. Vê tudo. Regista tudo. Partilha tudo.
Atenção: a necessidade do cliente não tira férias.
E Agora?
Este é o quarto artigo de um ciclo sobre o marketing com profundidade, coragem e verdade.
No próximo, vamos falar de resistência, foco e consistência e do que o marketing pode aprender com a lógica dos desportos de fundo.
Porque, no fim, a reputação que perdura não é a que mais grita é a que mais se transforma e a mais ataques resiste.
Até ao próximo episódio.
Teodoro Fernandes é um estratega de marcas, curioso por natureza e apaixonado por ideias que transformam. Ao longo dos anos, tem ajudado organizações a encontrarem clareza na forma como se posicionam, comunicam e actuam sobretudo em contextos onde o marketing precisa de ser mais do que um discurso.