A Reacção Das Marcas. Interesse Ou Atitude?
Artigo de opinião de Pedro Diogo Vaz
Várias Marcas têm tomado posições face ao conflito na Ucrânia, através de um boicote ao mercado Russo. A posição é extensível a vários sectores de actividade, desde as petrolíferas às empresas de tecnologia, das importantes redes sociais à indústria automóvel.
Os acontecimentos na Europa, com o despoletar da invasão da Ucrânia pela Rússia, têm vindo a tornar mais evidente que muitas Marcas estão disponíveis a assumir uma posição pública, mesmo que isso possa implicar algum prejuízo em termos de negócio.
Temos assistido diariamente, no mundo “ocidental”, a um crescente número de Marcas a anunciar o fim da sua operação ou a cessação da sua actividade na Rússia como forma de crítica efectiva à atitude do Governo Russo na invasão e conflito na Ucrânia.
Apesar da Rússia estar entre os maiores produtores de petróleo do Mundo, Marcas Multinacionais como a Shell, BP, Exxon Mobil ou a Total Energies, ou empresas portuguesas como a GALP ou a Prio, assumiram cessar a sua operação na (e com a) Rússia. Nas redes sociais, no sector automóvel, marcas como a Volvo, a alemã Daimler Truck, Volkswagen, Renault, Skoda, Jaguar Land Rover, BMW, Ford, Toyota, Honda Motor ou Hyundai, já assumiram a cessação da sua actividade naquele país, inclusive com o encerramento de algumas fábricas. Na indústria da moda, marcas como a Nike e Adidas, H&M e Mango anunciaram não apenas cessação temporária dos fornecimentos e encerramento de lojas, como efectivaram a saída da Bolsa de Valores. Uma série de outras Marcas relevantes como IKEA, Apple ou Lego, afirmaram a suspensão de fornecimentos para o mercado Russo, sendo que a assumpção deste tipo de posições sobe de dia para dia, com o escalar do conflito.
Face à dimensão do mercado e da economia russa, é perceptível que muitas destas posições não estão apenas relacionadas com questões operacionais (como a protecção das equipas ou impossibilidade de logística), mas são uma forma de afirmação da sua posição face ao conflito e de afirmação dos valores da Marca.
We must adjust to changing times and still hold to unchanging principles.
Jimmy Carter
Tem sido uma visão cada vez mais presente nos gestores e nos líderes, que a reputação da Marca é cada vez uma peça chave para o consumidor e para o mercado. Temas como a sustentabilidade, a responsabilidade social, a estimulação das equipas, têm estado na ordem do dia nas tomadas de decisão estratégicas de grandes Marcas a nível mundial. A fragilidade de não considerar devidamente estes aspectos é cada vez maior, podendo facilmente transformar-se em momentos de gestão de crise.
Esta realidade vem evidenciar um aspecto crítico em termos de gestão e liderança: a importância do equilíbrio entre os conceitos de interesse comercial e de interesse reputacional. Se as crises anteriores – e em particular a crise pandémica dos últimos dois anos – tinham já evidenciado isso, esta atitude vem demonstrar que as Marcas relevantes valorizam a assumpção de posições socialmente relevantes, pois mesmo que isso possa ter impactos imediatos no negócio, produzirá efeitos positivos na percepção pública da Marca a longo prazo, ajudando a fortalecer a percepção dos seus princípios, valores e estratégias.
Contudo, apesar das posições assumidas, será relevante perceber que o Consumidor está cada vez mais atento à atitude “sincera e real” das Marcas. Ou seja, é importante assumir posições consistentes, evidenciando uma posição real e sincera e não adoptar uma visão imediatista, de interesse puramente “comercial”.
Para a sociedade, as economias e as Marcas, estes são momentos de grande incerteza. Contudo, são simultaneamente estas as oportunidade para as Marcas afirmarem os seus valores e princípios, decidindo quais as posições a adoptar, ou – se preferirem não tomar decisões – manter a normalidade da sua actividade. À segunda-feira é fácil acertar na lotaria que saiu no domingo…
Pedro Diogo Vaz é profissional na área de Comunicação e Marketing, com uma carreira de quase 30 anos, num vasto percurso em empresas, agência e projectos internacionais, liderando o projecto Superbrands em Angola e Portugal, e pode ser contactado no LinkedIn.